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Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Respigos da vida escolar, do que se diz, pensa e faz

Avatar do autor julmar, 19.10.21

Cenas dos princípios do século XX, de um professor que anotava coisas

1 – Epifenómenos e excrescências

Já nos apercebemos que muitas criações do espírito reformador correspondem a epifenómenos. Uma das mais evidentes é a criação de departamentos em cujas reuniões para dar cumprimento ao regulamento e justificar as horas dos respectivos coordenadores se passa metade do tempo a justificar o que se não fez e a outra metade a planificar o que se não há-de fazer.

2 – Um aluno do 10º deu-me três erros numa só palavra – exactamente – que ele escreveu isatamente. Mandei-o escrevê-la 100 vezes, disse uma professora junto ao bar.

  1. A defunta área escola vai acabar este ano. Este é um bom exemplo de como o idealmente bom se perverte. Quando o cancro alastra, se sabe da existência e não se cura e se permite uma morte abominável. Tantos anos no faz de conta. Outros cancros começaram e galopam a toda a brida e tudo assobia virando a cabeça para o lado.

É interessante ver, nas actas e fichas anexas, o que se faz ou o que se diz que se faz. O padrão é sempre o mesmo: O que se vai fazer, consultar os alunos, às vezes define-se qualquer coisa, outras coisa nenhuma, para se concluir o ridículo “No final do 3º período concluir-se-ão os trabalhos”.

As áreas. Porque o espírito da moda odeia o conhecimento, o conhecimento disciplinar. Querem fazer a teia sem passar pelo fio, porque o importante é o todo e não a parte. Querem a integração sem passar pelos elementos. Morreu a área escola e já outras áreas apareceram: a área de projecto. Pede-se aos professores que inventem e uma vez que não sabem pedem aos alunos que inventem. No final acabarão por inventar um relatório que justifique a (falta de) invenção.

  1. Sobre visitas de estudo
  2. Como se constitui um arguido
  3. De como se mudam as regras depois do jogo começar
  4. Dos benefícios do ensino recorrente
  5. Das TIC como prioridade. Tão prioritárias que se coloca na formação geral do 10º ano. Mesmo para alunos que são do curso tecnológico de Informática ou que pelo seu contacto com os computadores estão muito à frente dos professores que os ensinam. Eles, arquitectos de currículos, hão de descobrir isso daqui a uns tempos.

9.

  1. Dia 23 de abril 2004, veio uma enc. de educação ao CD. Os professores desta escola só se interessam pelos bons alunos. A turma de desporto.
  2. Numa semana dedicada à educação pelo sr. Presidente da República, o Ministro David Justino, afirma publicamente que o nosso sistema de ensino está talhado para o insucesso. E esta, ah! – Maio de 2004.
  3. A bronca do concurso de professores. O pior de tudo é que já não há vergonha.
  4. Dia 17 de Maio de 2004, provas de aferição de Português para todos os alunos do 9º ano. Ainda serão necessárias provas de aferição para diagnosticar o que já se sabe? Ou estaremos ainda pior do que pensamos?
  5. Todos os DT. (todos os professores, todas as pessoas) deviam exercitar-se na escuta activa. A incompetência de muitos começa por aí: agem a priori fundados nos seus princípios de como acham que as coisas devem ser e isso impede-os da compreensão do que se passa. Não existe uma razão acima dos factos à qual estes tenham que se conformar. (a propósito da dificuldade em lidar com os E.E,)
  6. Das minhas leituras da vida real, faz parte a leitura de actas de Conselhos de Turma, desde há uns 15 anos. Há-de constituir um capítulo bem interessante de um livro, se algum dia for escrito. Da disortografia, à disgrafia, passando pelas construções sintácticas; das falhas formais aos receituários estereotipados, passe a redundância, aos conceitos que subjazem e que constituem as representações mentais do professorado. Nem é preciso inventar porque a realidade ultrapassa a ficção. E a (falta) de ordem, de estrutura. Pobres alunos.
  7. O lugar dos insucedidos.
  8. Numa reunião de CT opus-me a que se referisse que a turma é trabalhadora. Não deve constituir matéria de acta o que deve ser um comportamento normal. A menos que trabalhar se tenha tornado um facto excepcional. Dezembro de 2004
  9. É urgente mobilizar os professores contra os sindicatos: são os principais responsáveis pela mediocridade do nosso ensino.
  10. Um sindicalista é, por definição, um professor frustrado.
  11. Há dias, numa reunião de Departamento, dizia eu que muitas coisas tinham mudado na escola (devido à introdução, primeiro das aulas de 90 minutos, depois devido às aulas de substituição tinha-se tornado num lugar de maior silêncio) deixou de ser um parque de alunos, um sítio de permanente recreio. Em surdina ouvi um colega comentar: «- Pois, o recreio passou para dentro da sala de aula!»
  12. Os professores à medida que foram perdendo ciência, tiveram que ir ganhando paciência. Hoje há turmas em que já não há esperança de ensinar seja o que for.
  13. Saber ser, saber dizer, saber estar. Alguns experts de ciências de educação convenceram os responsáveis políticos, alguns deles doutos em Ciências da Educação, de que este seria o grande combate.
  14. De vez em quando fazem-se Conselhos de Turma por motivos disciplinares. Às vezes, é o comportamento de um aluno que está em causa. Não é incomum as reuniões demorarem duas ou três horas para se chegar a conclusão nenhuma, ou a medidas completamente inócuas. Claro que as contas nas instituições do Estado não se fazem. Numa reunião com a duração de três horas, do 3º ciclo em que participem 13 professores, são gastas 39 horas.

      Multiplique-se pelo preço hora e veja-se quanto se gasta.

Claro que os verdadeiros castigados são os professores. Ou o Estado que desperdiça recursos. Porque o aluno, de acordo com a ideologia dominante mesmo na classe dos professores, tem circunstâncias suficientes que justificam o seu comportamento. O castigo há-de ser sempre uma coisa tão almofadada e apaparicada que em vez de dor será prazer, isto é, prémio.

E nestas coisas o importante é o essencial. O essencial é o que não muda: o que não muda na modelação do comportamento é simples: O homem evita a dor e procura o prazer, ou formulado de forma mais culta traduz-se no princípio do prazer e no princípio da realidade. A educação, hodiernamente, situa-se no polo do prazer e os resultados estão à vista. O hedonismo é o clima em que se vive. E o clima é, para a educação e para a cultura, fatal.

  1. Em Fevereiro 2007, numa reunião em que se discutia o PEE, expunha eu algumas ideias. Entrou com grande atraso o nosso Torquemada que tendo ouvido apenas as últimas frases, disse:«- Eu discordo completamente!» Disse-lhe que tenho grande prazer que discordem de mim com a condição de eu compreender onde está a discordância.

Já não estou em idade para querelas pessoais. O que me interessa é mesmo o problema.        

  1. A visita do senhor inspector induziu abundante burocracia, pois além da que havia passou a haver muito mais.
  2. Quem manda nas escolas?
  3. Se ninguém te mostra, mostra-te tu. Foi mesmo assim no evento X que o Y fez. Os políticos são assim mesmo. De outro lado, vem outra lição de outro político: falar, falar, falar.
  4. Ela não compreende como pode haver professores que não fazem greve. Ainda não entendeu, talvez nunca entenda que não podemos obrigar os outros a adorar o nosso Deus. O fundamentalismo mora aí.
  5. Tempo de avaliações, tempos de exames. Só as avaliações dos alunos têm consequências. Todas as demais são inócuas. Ainda gostava que alguém fosse capaz de justificar que a repetição é «a medida pedagógica mais adequada». É mais uma daquelas expressões que entra pelo ouvido, soa bem e nos tira o trabalho de pensar. Como pode ser adequada uma medida que obriga o aluno a repetir com as mesmas matérias, os mesmos métodos... enfim, com tudo aquilo que levou a que não tivesse sucesso? E se não teve sucesso apenas em três ou quatro disciplinas, porque há-de repetir todas as outras? Antigamente, isto é, antes do 25 de Abril – que para nós portugueses constitui uma espécie de pré-história – o aluno teria que repetir apenas a secção de letras ou a secção de ciências. Agora, ainda que o aluno seja bom a Matemática, Física, Geografia, porque não foi bem-sucedido em Português, Inglês, História ele vai ter que começar o jogo todo. Depois queixam-se do insucesso e da indisciplina.
  6. Não são os enganos que nos tornam infelizes, mas antes os desenganos. O problema não é ser enganado, mas ser mal enganado.
  7. Com as aulas de 90 minutos, o recreio passou para dentro da sala de aula. Não se pode querer que um aluno esteja o tempo todo sentado, quieto, em silêncio com atenção ao que o professor diz. Para alguns alunos é naturalmente impossível.
  8. Quando um aluno tem fobia escolar, como se cumpre a lei?
  9. Os CEF são assim como uma espécie de remendo. E o remendo, ainda por cima mal deitado, não fica bem. Mas antes remendado do que roto. Ou não?