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Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Elogio do Facebook

Avatar do autor julmar, 24.07.20

Eu que me admiro por tudo e por nada, que sou capaz de me espantar com coisas a que ninguém dá importância, que me encanto com pouco, que sou adorador do Deus das Pequenas Coisas, como não me hei-de maravilhar com toda a inventividade dos dias que correm? Com os milagres da ciência e da tecnologia? Que isto é uma loucura, é. Mas vamos fechar os olhos para não ver? As coisas vêm lá muito de trás e sempre apreciei o gesto de Eva que aguardou que Deus fosse dar o seu passeio de fruição pela brisa fresca da tarde, para colher o fruto da árvore proibida.  A serpente, o mais astuto dos animais à face da terra, disse-lhe: Ficareis a conhecer o bem e o mal, vós sereis como deus. E, foi assim, que da costela de Adão, depois de uma longa caminhada,  chegámos ao Facebook pela mão de Mark Zukerberger. Quem quiser os pormenores sobre esta caminhada tem muito que estudar mas  Yuval Noah Harari com os seus livros, em particular, Homo Deus - uma Breve História do Amanhã, pode constituir uma excelente ajuda. Se o fizer, saiba que está a repetir o gesto de Eva, isto é, a cometer o único pecado capital: A desobediência. Foi assim que todos os poderes na terra interditaram o acesso ao saber que codificaram em escrita  a que só acedia uma elite; foi assim que as religiões ajudaram a preservar os mistérios; foi assim que a Igreja Católica preservou em latim toda a liturgia até ao Concílio Vaticano II (1962); foi assim que a mesma Igreja criou o Ìndice e a Inquisição; foi assim que muitas bibliotecas tinham secções reservadas (O Nome da Rosa); foi assim que se fizeram fogueiras que serviram para queimar livros e, por vezes, os seus autores. Foi assim que todas as ditaduras, a nossa também, quiseram manter o povo ignorante - porque a inocência é uma virtude - e usaram a censura. 

Há na histórias épocas completamente explosivas em que um conjunto vasto de coisas amadureceram e desabrocham, em torrente, entrosando-se umas na outras num curso imparável. É o que acontece no século XVI e XVII com a invenção da Imprensa, com a descoberta do novo mundo, com a reforma religiosa, com a ciência, sobretudo, com a nova ciência.

Cinco séculos depois, estamos numa situação com algumas semelhanças: uma ordem perdida e uma outra que não sabemos como será. Incerteza, confusão, medo.

E voltamos ao facebook. Há sempre ( e eu vejo nisso uma enorme vantagem) os que não sendo reacinários, não querem que as coisas andem, não querem perder a ordem estabelecida e recusam-se a entrar numa (des)ordem diferente. Mais do que isso, não querem que ninguém entre. Lembro as crónicas semanais de António Barreto, no Público, quando chegaram os telemóveis. Penso que, provavelmente, hoje usará um. Lembro Miguel de Sousa Tavares que pensa que toda a gente é filha de escritores e jornalistas, que ostensivamente escreve fora do novo acordo ortográfico e que acha que quem não escreve tão bem como ele não deveria escrever. Primeiro insurgia-se contra os blogs, agora acha que as redes sociais e, nomeadamente, o facebook, vai dar cabo da língua portuguesa. Depois ficamos sempre sem saber como sabe do que se passa nas redes sociais se diz não as frequentar. Tenho para mim que gente que não lia passou a ler e gente que não escrevia, passou a escrever. Dirá que escrevem e lêm mal. Mas será preferível a não o fazer. Quanto aos conteúdos que por lá passam - sentimentos, opiniões, ideias - são os das mesmas pessoas que andam no mundo real que trocaram a conversa da taberna e do café ou dos lavadoiros da roupa pela Internet. Quanto às notícias falsas - as fake news - são tão velhas como a humanidade, a começar com o mito da expulsão do paraíso celeste. A História está cheia delas. A História de Portugal, também. Veja-se  a crónica de Fernão Lopes, quando, pelas ruas de Lisboa, grupos orquestrados lançam o falso pregão: - Acorram ao Mestre, matam o Mestre. Os homens continuam muito iguais ao que sempre foram. É o mesmo o homem que caminha pela selva e o que viaja em avião. O que os separa é a tenologia que usam. 

Tenho amigos que, não usam o facebook, uns por incompetência técnica, outros por escolha. Por mim, procuro tirar o máximo partido da tecnologia: Encontrei amigos, colegas de há mitos anos, encontrei excelentes pessoas neste espaço virtual, publicito aqui os meus posts dos meus blogs, sei como vão os meus familiares e conterrâneos. Só vejo e leio quem quero, só me vê e lê quem quero. Como na vida, é preciso saber estar.

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