Pessoas e lugares da minha vida - A minha manhã submersa I
julmar, 03.12.15
Eu sou aquele ali, tão longe de imaginar que eu o estaria ver daqui num espaço e num tempo tão diferente. O velho a olhar o menino e todos os seus colegas que agora serão velhos também. Sim, lá está o Veríssimo, o Sérgio, o França, o Amaral da Mizarela mais o sobrinho tão pequenino como ele, o Manel de Jesus do Safurdão que um dia se meteu de bicicleta e me foi visitar à Vila; O Zé Vaz do Escabralhado; o Sérgio, o Pires, o Armindo, o Egídio o único que se ordenou padre; o Carriço, O Cabanas de Alvito,o Sebastião, o Alexandre Araújo, meu conterrâneo; O Zé Alberto, o Coelho, o Dias, o Vilaça, o Gomes, o Amaro, o Rico, o Ferraz, o Finote, o Lucas. Reconheço todos os rostos, o lugar de onde vieram, as suas habilidades, jeitos e feitios e, com tempo, escreveria o nome de todos. Todos de pescoço apertado com gravata que mais tarde haveria de ser com cabeção se não se desviassem do caminho do Senhor. Retiro: oração, pregação, meditação, silêncio. Três dias sem abrir o bico porque Deus só se ouve no silêncio. O menino ouvia a pregação, tentava meditar mas o espírito esgueirava-se para assuntos mundanos e banais; às vezes fugia para casa dos pais, ouvia a voz da mãe: «É bom ires para o seminário, livras-te deste inferno de trabalhos, vais ter uma vida muito bonita».De repente, acordava à voz do padre Aparício: «Muitos são os chamados e poucos os escolhidos». E o menino, aos poucos, ia perdendo aos poucos a alegria que o fazia assobiar e cantar e sonhar.