A decapitação da cultura
julmar, 17.01.14
Está-me difícil viver neste país. Mas que não me mandem emigrar, que não me digam bacocamente que quem está mal muda-se porque não abdico do meu país, da minha cultura, dos amigos, da família. O que custa é ver um país que se afunda, um país sem rumo, um país que se esvai em recursos e em gente. Um país sem projetos e sem sonhos. Um país onde às elites dirigentes sobra em ganância e avidez de poder o que lhe falta em saber e cultura. Um país onde a política se reduz à tencocracia, onde o primeiro ministro não passa de um contabilista básico do deve e haver sustentado num economês que sirva os interesses de quem o pode sustentar.
Reduzimos toda a vida a uma única dimensão: à economia e às ciências que imediatamente a possam servir. Ciências Sociais, Literatura, Arte, História, Filosofia? Para quê? Isso são luxos a que não nos podemos entregar. Ensino obrigatório até ao 12º ano? Dinheiro para Investigação só se investigarmos hoje e o resultado surgir na economia no dia seguinte que o que a gente precisa é dinheiro.
Por isso, nunca sairemos do buraco porque o povo, tornado burro de carga, não merece deixar de o ser. O nosso déficit é económico porque ali desagua o nosso deficit de cidadania, o nosso deficit de educação, o nosso deficit de cultura científica ... e de cultura apenas. É que quem luta apenas por pão nem pão tem que baste. O burro de carga cada vez carrega mais e cada vez o que carrega vale menos. E quanto mais pesada é a carga mais fixa o olhar no chão que pisa, e cada vez passa mais tempo a carregar. Por isso, já não sabe que há sol e que há estrelas, e que há céu ... e que há flores e perfume. E no esquecimento começa a morte.