Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

A realidade da ficção

Avatar do autor julmar, 04.05.22

Vidas Seguintes - Abdulrazak Gurnah - Compra Livros na Fnac.pt

A escolha desta leitura radica na minha viagem ficcionada, passo a passo,  que atravessa África de Alexandria ao Cabo da Boa Esperança. Este romance faz parte dessa viagem. Engana-se quem pensa que há uma oposição entre realidade e ficção. As vidas realmente reais são muito pobres.

Abdulrazak Gurnah, de origem tanzaniana, nascido em 1948 foi agraciado com o Prémio Nobel de Literatura 2021 «pela forma determinada e humana com que aborda e aprofunda as consequências do colonialismo e o destino do refugiado no fosso entre culturas e continentes». 

"Após fugir da aldeia onde nasceu, numa região fustigada pela pobreza, pela fome e pela doença, o jovem Ilyas chega a uma pequena cidade costeira onde assiste a um desfile da Schutztruppe, a feroz tropa de protecção da África Oriental Alemã. Anos mais tarde, perante a iminência de uma grande guerra entre Britânicos e Alemães, que estalaria em Tanga, em 1914, Ilyas decide juntar-se a esse mesmo exército de mercenários africanos, prometendo à sua irmã mais nova voltar muito em breve. A promessa fica por cumprir, e o paradeiro desconhecido do irmão ensombra a vida de Afiya até que ela conhece Hamza, um desertor generoso e sonhador que conseguiu escapar aos horrores da guerra. Entre ambos nascerá uma história de amor improvável que ligará as duas famílias, e os continentes africano e europeu.

Entrelaçando história e ficção, Vidas Seguintes é um romance lúcido e trágico sobre África, o legado colonial e as atrocidades da guerra, bem como as infinitas contradições da natureza humana."

Porque hoje é Dia da Mãe

Avatar do autor julmar, 01.05.22

gracajulio.JPG

(Poema de A. Gedeão adaptado)
Mãezinha
A terra de meu pai era pequena
E os transportes difíceis.
Não havia comboios, nem automóveis, nem aviões, nem mísseis.
Corria branda a noite e a vida era serena.
Segundo informação, concreta e exacta,
Dos boletins oficiais,
Viviam lá na terra a essa data
434 mulheres, das quais
45 por cento eram de tenra idade,
chamando tenra idade
à que vai desde o berço até à puberdade.
28 por cento das restantes
eram senhoras, daquelas senhoras que só havia dantes.
Umas, viúvas, que nunca mais (oh! Nunca mais) tinham sequer sorrido
Desde o dia da morte do extremoso marido;
Outras, senhoras casadas, mães de filhos …
(De resto, as senhoras casadas,
Pelas suas próprias condições,
 não têm que ser consideradas nestas considerações.)
Das outras, 10 por cento,
Eram meninas casadoiras, seriíssimas, discretas,
Mas que, por temperamento,
Ou por outras razões mais ou menos secretas,
 não se inclinavam para o casamento.
Além destas meninas
Havia, salvo erro, 16,
Que há meiga luz das horas vespertinas
Se punham a bordar por detrás das cortinas
Esperando, de revés, quem passava nas ruas.
Dessas havia cinco que moravam
Na que se chamava rua Direita
Que das Portas ao Muro subia
No troço habitual que meu pai percorria.
Dessas cico excelentes raparigas
Uma fugiu com o criado da lavoura;
duas morreram novas de bexigas;
Outra, que veio a ser grande senhora,
 teve as suas fraquezas mas casou-se                                
e foi condessa por real mercê;
outra suicidou-se
não se sabe porquê
A que sobeja
Por nome Graça tinha
Foi essa a que meu pai levou à igreja.
Foi a minha mãezinha
Poema de A. Gedeão (Adaptado)