Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Nada é para sempre

Avatar do autor julmar, 27.04.22

Livro: Para um Diálogo das Civilizações o Ocidente é um Acidente - Garaudy  Roger(sinopsae na Descrição) | Estante Virtual

Há livros que não esquecemos, mesmo que os tenhamos lido há trinta anos. Não havia internet, nas bibliotecas escolares e públicas havia livros que não davam entrada e a compra de um livro significava renunciar a qualquer outra coisa, talvez a uma dúzia de ´bicas´( termo caído em desuso).  Sobre o assunto, li outros livros ente os quais "O Choque de Civilizaçóes" de Samuel Untington, "O Naufrágio de Civilizações" de Amin Maalouf, "Decadência - O Declínio do Ocidente" de M. Onfray. Entre outros. Porém, foi o livro de R. Garaudy que me marcou, sobretudo a tese contida no subtítulo - O Ocidente é um acidente. Um acidente que se tornou um centro da civilização par os que lá moram. Uma civilização que nasceu, cresceu, marcou um período brilhante na história do nosso planeta mas que inexoravelmente morrerá um dia. Nada é para sempre.

 

Reencontros inteletuais

Avatar do autor julmar, 26.04.22

Wook.pt - Autos-de-Fé - A Arte de Destruir Livros

Há dois anos, li um livro grande (um grande livro, também) deste autor - "A Decadência - O declínio do Ocidente". Autos-de-fé" é um pequeno livro que percorre muitas ideias do século XIX e XX que mais do que na universidade fui entranhando por conta própria e algumas das quais achei que seriam o lugar da verdade, no tempo que pensei que pudesse existir um tal lugar.  Foi-me muito grato encontrar neste pequeno livro autores, textos, ideias que viveram em mim desde o maoísmo (sim, também li 'O Pequeno Livro Vermelho' de Mao), O Arquipélago Gulag (lido recentemente), o marxismo leninismo (sim, como Sartre cheguei a considerar o marxismo a filosofia inultrapassável do nosso tempo), o 'Choque das Civilizações, de Samuel Huntington e O Livro Negro da Psicanálise. 

E o exercício sobre eles é o que Onfray nos propõe:

"Autos-de-fé propõe um exercício prático: ver como livros essenciais para estabelecer a verdade foram torpedeados para evitar que as suas mensagens, verdadeiras, não chegassem ao seu destino.

Pelos seus danos? Pela sua perigosidade? Pela sua toxicidade? Pela sua ameaça? Foram muitos os livros que se propuseram destruir as mitologias do momento.

Mas é sabido: o primeiro a dizer a verdade tem de ser executado.

Autos-de-fé é um livro que chama os bois pelos nomes: contra o decolonialismo, o neofeminismo, o racialismo, a teoria do género, o comunitarismo, que estão a formar um verdadeiro neofascismo de esquerda, com a cumplicidade activa de muitos intelectuais e universitários.

E, a propósito do Arquipélago Gulag:

"E os detidos são culpados de quê? É necessário esquecer essa ideia de que no regime marxista-leninista uma detenção obedece a uma razão clara, definida! É por causa de tudo e de nada, de uma outra coisa, não importa o quê. Uma bagatela, uma suspeita, uma denúncia, o arbítrio. Trata-se, para o poder, de governar com o terror: o indivíduo que nada tem para se censurar, deve censurar-se por não ter nada de que se censurar. Essa é a grande lição de 1793. Os poderosos bolcheviques querem que os miseráveis do povo tenham medo e tremam sem cessar para que se torne zelosos, obedientes, dóceis, submissos, disciplinados, dominados. A coberta do comunismo e da felicidade dos povos, O regime fabrica escravos em quantidade industrial." Página 56

A propósito desta leitura

Avatar do autor julmar, 22.04.22

.Religião Para Ateus

Há ateus que o são por nunca terem tido qualquer tipo de crença ou educação religiosa; há ateus que perderam a fé revoltados com práticas indignas de leigos, mas sobretudo de hierarquias da Igreja; há ainda aqueles que abandoram crenças religiosas por as acharem irracionais de um ponto de vista científico ou filosófico. Para os que receberam uma educação cristã, como é o meu caso, serão cristãos durante a vida inteira. Cristãos de um modo diferente, mas cristãos porque a cultura recebida é uma herança que não é apenas um fato que se substitui por outro. O livro que mais ouvi, e ouvi repetidamente a ponto de ainda hoje saber alguns textos de cor, foi a Bíblia, extratos do Velho e, sobretudo, do Novo Testamento. Foi o primeiro livro que tive, durante muitos anos o único livro que tive. Um livro grande onde encontra de tudo, mesmo literatura que uma criança como eu, na altura era suposto não ler. Porém, algumas práticas religiosas eram demoradas, a maior parte delas repetitivas, os dias de "retiro" eram silenciosos e intermináveis e aquele livro era o único e era, diziam os meus prefeitos orientadores, o livro dos livros, aquele que sempre nos devia acompanhar. Por isso, eu voraz leitor até hoje, fui descobrindo lugares da Bíblia que nunca eram ouvidos, uns que me deleitavam, outros que me excitavam e outros que me atormentavam ou até aterrorizavam. Descobri nele a poesia erótica que áquela altura, superava, na ausência de imagem, a "Playboy". Hoje, simplesmente, acho bela esta poesia do livro 'O Cântico dos Cânticos de Salomão" que assim começa:

Anseios de amor

Ela .

2 Sua boca me cubra de beijos! São mais suaves que o vinho tuas carícias,

3 e mais aromáticos que teus perfumes

é teu nome, mais que perfume derramado;

por isso as jovens de ti se enamoram.

4 Leva-me contigo! Corramos!

O rei introduziu-me em seus aposentos.

Coro.

Queremos contigo exultar de gozo e alegria,

celebrando tuas carícias, superiores ao vinho.

Com razão as jovens de ti se enamoram."

A par de de muitas e belas histórias edificantes que nos falam da bondade e de tudo o que mais apreciamos no ser humano, aparecem figuras tenebrosas e histórias de terror onde o ódio e a ira têm primazia. A biblia  assenta, enfim, não apenas na luta do bem contra o mal mas na luta dos bons contra os maus e num termo que é um juízo final onde os maus serão maus para toda a eternidade e lançados no fogo do inferno. E o Apocalise pertence ao Novo Testamento e as imagens apresentadas não são apenas metáforas.

Por que razão a Igreja Católica resistiu durante tanto tempo a que a Bíblia fosse traduzida para as línguas que as gentes conheciam? Porque é que só a partir do concílio Vaticano II amissa pôde ser na lingua que cada um entende?

Razão tinha o velho padre que, por infeliz coincidência, celebrou a primeira missa em que a primeira leitura começava: "Abraão teve dois filhos, um da mulher livre outro da mulher escrava". Interrompeu e, agastado, disse: "Porra, porra meus irmãos, vamos mas é voltar ao latim!"

A par de tudo isso, continuo a ler com prazer pérolas bíblicas como esta exortação, quase poética, do misógino Paulo de Tarso, figura admirável da Igreja, sem o qual S. Pedro não conseguiria edificar a sua Igreja e todo o mundo hoje seria outro.

Elogio do amor

1 Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine.

2 Mesmo que eu tivesse o dom da profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência; mesmo que tivesse toda a fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, não sou nada.

3 Ainda que distribuísse todos os meus bens em sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada valeria!

4 A caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante.

5 Nem escandalosa. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor.

6 Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade.

7 Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

8 A caridade jamais acabará. As profecias desaparecerão, o dom das línguas cessará, o dom da ciência findará.

9 A nossa ciência é parcial, a nossa profecia é imperfeita.

10 Quando chegar o que é perfeito, o imperfeito desaparecerá.

11 Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança.

12 Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido.

13 Por ora subsistem a fé, a esperança e a caridade – as três. Porém, a maior delas é a caridade

Afinal, falei não falando da minha leitura. Leiam que vale a pena. E leiam sem medo porque quando chegarem ao fim, concluirão que, afinal, feitos uns acertos às vossas conveniências, acharão que o melhor é não mudar.

Leituras passadas

Avatar do autor julmar, 21.04.22

Para um diálogo das civilizações (O ocidente é um acidente) - Roger Garaudy  - Esconderijo dos Livros® - ALFARRABISTA

Roger Garaudy  (1913- 2012), Filósofo, Professor e Político francês. Formado em Filosofia, exerceu funções docentes na região da Tarn, tendo sido eleito deputado nesta região. Em 1939 foi preso e deportado para Argel até ao fim da Segunda Guerra Mundial. Em 1945, regressa a França e ao Partido Comunista Francês tendo sido membro do Comité Central, tendo permanecido na vida política até 1970. Em 1953 faz o seu doutoramento apresentado a dissertação “La Théorie Maatérlialiste de la Connaissance.” Da sua bibliografia destacam-se as obras: La Liberté (1955), Um realismo Sem Fronteiras (1965), A Grande Viragem ao Socialismo (1969), A Alternativa (1972).

O que sabemos hoje vem do trabalho que tivemos ontem. E esta foi uma das leituras marcantes, do tempo da guerra fria. Hoje, quem não sabe o que se passou ontem, não pode entender o que se está a passar, para já na Ucrânia. Durante a "guerra quente" ninguém pensa. Mais tarde, haverão de se perguntar como foi possível. A história repete-se. 

"Talvez nunca se tenha escrito um requisitório mais implacável contra os crimes do homem branco para preparar uma ordem mundial nova a partir de um diálogo com as civilizações da Ásia, do Islão, da África, da América Latina.
Perspectivando a nossa história e o nosso futuro a partir de um ponto de vista que já não tem o seu centro na Europa, Garaudy denuncia neste livro essa ilusão segundo a qual o Ocidente - minúscula península da Ásia e modesto intermediário nos milénios das civilizações - foi o único criador de valores humanos e evoca as ocasiões perdidas da história e as dimensões a reencontrar do homem se quisermos criar um futuro de face humana."

 

 

A paixão de Cristo

Avatar do autor julmar, 12.04.22

Dalí – CRISTO DE SÃO JOÃO DA CRUZ - VÍRUS DA ARTE & CIA.

(Salvador Dali)

Os filósofos dizem coisas banais, coisas que toda gente conhece, coisas que toda a gente diz. Na sequência de tais coisas chegarão a outras que se escondem por trás e esse é mesmo o seu trabalho específico, ir além das aparências. Eu, longinqua sombra do iluminado e iluminista filósofo alemão, I.Kant (1724-1804), consigo, pelo menos, imitá-lo no seu comportamento disciplinado de começar cada dia com uma caminhada, de preferência, antes do nascer do sol. I. Kant, meu mestre, cujo pensamento expliquei, centenas de vezes a milhares de jovens, não sei com que resultados dada a dificuldade de entendimento da Crítica da Razão Pura e da Crítica da Razão Prática. 

Uma caminhada é um encontro com o mundo, com a natureza - o chão que pisamos, o ar que respiramos, os sons, os cheiros, as formas, cores. Desdobramo-nos em sensações, pensamentos, recordações como se o tempo não tivesse tempo, num certo estado de embriaguez. Um mundo fenomenal que ordenamos, categorizamos na tentativa incerta de encontrar um sentido humano. A questão de poder (ou dever) ser um caminho para todos é ela própria filosófica.

Por isso, a religião é importante (mesmo para Hegel que a considerava como a filosofia para ignorantes). Por causa da perdição e da salvação. Porque mesmo adultos continuamos a ser crianças e precisamos, como elas para adormecerem, de uma história que nos resolva o problema da nossa tragédia de sermos humanos - seres frágeis, vulneráveis num mundo de perigos e com um desfecho inexorável - a morte. Precisamos de uma história que tenha um final feliz.

O ciclo litúrgico conta-nos essa história que atinge o seu climax na Semana Santa. Era um tempo sagrado onde tudo era meticulosamente preparado: as imagens dos santos eram cobertas por panos, os sinos -substituídos pelas matracas - deixavam de tocar, a purificação era exterior ( casas, ruas, roupas, louças, corpos, tudo lavado) e interior - a desobriga - o reconhecimento de que somos pecadores, o arrependimento, a conversão e o perdão. Tudo preparado para um desfecho feliz: a Ressurreição. Para quem nasce e vive num mundo assim, qualquer outro é uma loucura. Não há mundo mais perfeito que este mundo imperfeito. A única incerteza é individual: a fé e as boas obras serão suficientes para entrar no reino do céu? É isso que obriga o crente a não descurar, quotidianamente, o cumprimento da palavra de Deus, a ser fiel. 

Por isso, este domingo a minha caminhada matinal me suscitou estas reflexões e apreensão.

Penso que pela primeira vez , na Vila, não se terá celebrado religiosamente o Domingo de Ramos. Ver os campos abandonados, ver a falta de gente, ouvir o silêncio pesado das ruas desertas é doloroso. Porém, neste domingo, ver a porta da Igreja fechada é trágico. Fecharam os moinhos, as eiras e o forno; os lagares e os alambiques; as escolas, também.

Mas a igreja a igreja fechada ... é uma outra dimensão.

Teremos, felizmente, a representação da Paixão