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Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Badameco

Anotações, observações, reflexões sobre quase tudo o que me (co)move

Andar passo a passo, com paragem obrigatória

Avatar do autor julmar, 30.11.19

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Não há ventos que não pretem
Nem marés que não convenham
Nem forças que me molestem
Poderes que me detenham
Há muitos anos, tomei de empréstimo de António Gedeão, meu querido mestre, para meu lema de vida, esta estrofe do seu poema, "Fala do homem nascido". E dou-lhe cumprimento cada dia. Dia 11, como se vê no gráfico, não aconteceu. Afinal, os buracos existem, o não ser espreita-nos permanentemente.

Na margem do Nilo

Avatar do autor julmar, 19.11.19

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Será possível encontrarmo-nos connosco? Pois é. Passados 10 anos, venho encontrar-me na margem do Nilo com este turista de t-shirt azul, óculos de sol e máquina fotográfica a tiracolo que ficou surpreso por me encontrar, atirou-me que estava mais velho. Perguntou-me para onde ia e eu que ia ao encontro da nascente do Nilo e ele que ia até à foz do Nilo. Em sentido oposto, ele turista de cruzeiro, eu pedantibus.

Pergunta-me quando  voltaremos a encontrar-nos. Talvez daqui a 10 anos na nossa casa da vila, respondi-lhe. 

A reta é a mais curta distância para a morte

Avatar do autor julmar, 18.11.19

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Nos bancos da escola aprendi que a linha reta é um conjunto infinito de pontos e que um segmento de reta é a mais curta distância entre dois pontos. Aprendi mais tarde que este era um dos postulados da Geometria de Euclides (viveu cerca de 300 anos a. C., em Alexandria), considerado o pai da Geometria que tal como a  Física de Aristóteles, é tão bela, tão falsa e tão útil no nosso quotidiano. Haveriam de surgir outras geometrias, no século XIX, - entre elas a geometia hiperbólica (Lobachevsky) e a geometria elíptica (Riemann) - de mais difícil entendimento por se encontrarem ausentes do mundo como naturalmente o vemos.

Ainda que o quisesse, nas minhas caminhadas não poderia caminhar em reta. Quando caminho da cidade do Cairo à cidade de Luxor, o meu calculador de distâncias dá-me sempre dois valores: Distância 504,29 km; Rota - 642,62km. Em rigor, se quisesse caminhar em linha reta de uma cidade à outra, teria de entrar pela terra dentro como uma toupeira, dado que, como hoje sabemos a terra é esférica - que os terraplanistas, cujo número dizem  estar a crescer consideravelmente, me perdoem. 

Quem na vida anda sempre na mesma direção, deverá aprender menos, viver menos do que aquele que não dá carreira direita, que se engana, que vai por aqui e por ali, que vai para a frente e volta para trás, que se perde. Talvez que a linha que une o nascimento à morte não sela uma reta mas um emaranhado de linhas curvas. Desde a infância em que rodava o arco  que prefiro as curvas.Image result for brinquedos antigos o arco

 

Põe-te em movimento, anda! Abençoado seja todo aquele que caminha.

Avatar do autor julmar, 15.11.19

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Sabendo que ia ter uns dias em que, por força maior, iria estar impedido de andar, passei pela FNAC (tenho muita saudade das velhas livrarias do Porto, mas os tempos são outros) e procurei um livro que, de outra forma, me transportasse para outros lugares. A escolha foi rápida: A imagem da capa, o título - sim, o título -, a autora, prémio nobel a literatura. 

Comecei  a ler e não é uma leitura fácil. Não são, propriamente contos e também não é um romance. É à medida que vamos lendo que nos deparamos com um puzlle e que nos compete a nós construí-lo. Para isso, temos de encontrar a cola que une as peças que encontramos no título original: BIEGUNI, que a tradutora em nota de rodapé explicita "Designa uma seita de antigos crentes ortododoxos que tratavam o movimento de maneira sagrada. Estar em constante movimento e atravessar fronteiras significava para eles não se apegar a nada e tentar fugir do mal que tenta privar-nos da liberdade". 

É também um retrato e uma crítica à nossa sociedade tão veloz e tão estática 

"Aquele que parar ficará petrificado; aquele que se detivera por um instante será alfinetado como o inseto, o seu coração será teres passado por uma agulha de madeira, as suas mãos e pés serão furados e pregados as ombreiras das portas.
Foi assim que morreu aquele que usou revoltar-se. Foi capturado e o seu corpo pregado na cruz, imobilizado como o de um inseto, para ser visto por olhos humanos e inumanos, mas principalmente por inumanos - os que mais se de leitam com estas cenas. Por isso, não é de estranhar que a reconstruam todos os anos e a celebrem, rezando a um corpo morto. E é também por isso que os tiranos de todas as espécies são servos infernais que transportam no sangue o ódio de morte aos povos nómadas. Daí as perseguições a judeus e ciganos. Daí que os homens livres sejam forçados a estabelecer-se e, depois marcados com uma morada que para nós é uma sentença. O que eles pretendem é estabelecer uma ordem sólida e tornar a passagem do tempo aparente, de modo a que os dias se tornem repetitivos e não se distingam uns dos outros. Querem construir uma grande máquina, na qual cada criatura terá de ocupar um determinado lugar executar movimentos, também eles aparentes - as instituições e os gabinetes, os carimbos e as circulares, a hierarquia e os cargos, as patentes, os requerimentos e os indiferimentos, os passaportes, os números, os cartões, resultados das eleições, as promoções e acumulação de pontos e a troca de umas coisas por outras.

Alfinetar o mundo com a ajuda de códigos de barras, colar um rótulo em todas as coisas para que se saiba que a mercadoria e é aquela e quanto custa. Que esta estranha língua seja incompreensível para as pessoas, que seja apenas lida por máquinas e autómatos e que estas façam recitais da sua poesia em códigos de barras, pela noites dentro, no interior das grandes lojas subterrâneas.

Põe-te em movimento, anda.! Abençoado seja todo aquele que caminha.