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Ali estás tu metido numa sotaina preta, apertada por uma faixa vermelha a treinar para um ofício que nunca virás a exercer. Lá estão os velhos companheiros que contigo vieram de Beja e os que aqui vieste encontrar em Évora, incluso alguns timorenses. O menino que foras, era agora um adolescente que frequentava aulas de Filosofia lecionadas pelo canónico Júlio Chorão, ficando tu muito longe de perceberes o que era a filosofia; decoraste e nunca mais esqueceste as figuras dos silogismos (BARBARA, CELARENT, DARII, FERIO...) a partir do grosso e pesado Manuale Philosophiae, ad usum seminariorum, de I. Di Napoli. Assim mesmo, filosofia estudada em latim. A ilustração, o espírito crítico, a interrogação havias de as construir a partir da tua desconfiança e dúvida sobre as irracionalidades em que tropeçavas a todo o momento. Fé, precisas de ter fé. Não rezas porque tens fé, rezas para teres fé: Senhor, aumentai a nossa fé pedias num circulo vicioso que não deu em nada. Queriam que tu fosses transparente mas tu só podias dizer que sim que acreditavas, que amavas Deus e a Virgem e que seguias todos os preceitos da Igreja católica, apostólica e romana e que querias de todo o coração ser o eleito do Senhor. E tu, sem o saberes seguias o conselho daquele que viria a ser o teu apreciado Espinoza: Obediência na ação, liberdade no pensamento. Talvez por isso, te achassem tão enigmático e obscuro. Como se pode ser transparente num ambiente de pressão, repressão e de violência? Por que lhes darias tu acesso ao teu pensamento, aos teus projetos? Como lhes confessarias esse pecado da desobediência ao pensamento único? E tinhas que suportar a palavra de Deus, escolhida de propósito para com ela te zurzirem, a torto e a direito, de manhã, ao meio dia e à noite, todos os dias: que sois sepulcros caiados, que são muitos os chamados e poucos os escolhidos, que por isto e por aquilo serás um condenado ao inferno, um fariseu, um maldito que no juízo final tomarás a esquerda do Deus todo poderoso. E mostraram-te o Inferno onde as almas dos condenados ardiam em chamas eternas!
Mas o mundo estava a mudar, a Igreja também. Às escondidas, lá ias lendo (não entendendo muito do que lias) sobre as dissidências, os padres operários, a teologia da libertação, os cadernos da GEDOC de Nuno Teotónio Perereira e dos padres Feliciano Alves e Abílo Cardoso que nesse ano de 1969 haviam tido início. Bem que o Madureira (que viria a ser bispo) quis entrar no teu mundo, com perguntas e mais perguntas ficando a saber o mesmo. Nada.É verdade que te quis pôr fora do seminário. Um tal padre Urbano, de Beja, opôs-se. E tu lá foste para o Seminário Maior de Coimbra depois de teres aprendido as figuras dos silogismos, a iniciação ao grego, a Literatura com o Sebastiaõ, a continuação do latim com o Sardo e o grupo polifónico com o Alegria. Todos padres, cónegos, doutores.