![Resultado de imagem para uma caverna de Platão]()
Provavelmente nunca a filosofia floresceu e teve a vitalidade dos primeiros filósofos gregos. Nela se sente a originalidade de quem não recorre a um passado para se justificar. O "logos" não havia ainda ganho o domínio e a unidade e diversidade coexistiam dialéticamente.
Com Platão a filosofia institucionaliza-se, sistematiza-se, cristaliza-se, escreve-se, sedentariza-se.
Sócrates filosofava na rua, na praça, não escolhia lugar. Com Platão a filosofia passa a ter um lugar próprio - A Academia, a Escola.
Sócrates não escolhia auditório: partia do princípio de que todo o homem é filósofo, que qualquer um pode encontrar a verdade. Platão divide os homens em categorias, impõe condições para entrar na academia: " Proibida a entrada a quem não souber matemática”: propedêutica obrigatória, a seleção começava. Sócrates interrogava, Platão ensinava. Passa-se de um saber constituinte a umo saber constituído. Dá-se a cristalização do saber.
Com a morte de Sócrates que será apenas a primeira,a filosofia sedentariza-se. A polis não suportava um saber que não podia controlar.
A filosofia de Sócrates era de crítica às instituições. Platão tentará colocar filosofia ao serviço da instituição. O filósofo deixará de assumir consciência crítica e passará a ser um funcionário da instituição e pago por ela.
E o mito da caverna vingou. No ensino também. O contacto directo com a vida e seus problemas deixou de existir. E todos os aprendizes de filósofo entram na caverna: "estão lá dentro desde infância, algemados de perdas e pescoço, de tal maneira que só lhes é dado permanecer no mesmo lugar e olhar em frente; são incapazes de voltar a cabeça, por causa dos grilhões”.
Em frente, em cima do estrado, o professor faz passar as imagens sonoras, por vezes visuais. Essas imagens não são as próprias coisas mas tomam-nas como tais. Um ensino livresco, divorciado da realidade.
«… se eles fossem capazes de conversar uns com os outros que te parece, achas que eles julgaríamos estar a nomear objetos reais, quando designavam apenas as sombras que viam? " Ensino nominalista. «Considera depois, como reagiriam se fossem soltos das cadeias ". Saídos da caverna, ficarão deslumbrados por não ver ligação entre o que aprenderam e a vida real. Ou talvez não.
Poderá parecer um pouco caricatural a analgia estabelecida, mas não deixará contudo de traduzir muito do que se passa hoje na sala de aula. Aliás, este mito, tão simbolicamente rico, não deixa de traduzir, num contexto mais vasto, a vida da civilização ocidental.
O professor, único que viveu no mundo das ideias (ou que conhece melhor o jogo das cavernas?) regressa à caverna e compete-lhe, agora, conduzir os outros através de uma ascese a esse mesmo mundo. Nem todos o conseguem. Os que o conseguirem serão, no entanto, o reis, os guardas da cidade. Os outros que não se purificaram da ignorância serão os súbditos.
O Mito surtiu efeito. Se não é a cidade ideal que foi construída dela se aproxima em muitos aspetos. Por isso, é um erro considerar Platão como um político frustrado. Platão continua vivo.
Somos habitantes da caverna, seus prisioneiros e não sabemos onde se encontra a porta. Se a encontrarmos de pouco vale pois quem tentar dirigir-se para ela será tratado de parvo ou criminoso. Todos dizem mal da prisão mas detestam sair dela. Nascemos nela e a ela nos habituámos.
Pedagogicamente, os conservadores procuram manter as leis e regras que tornam possível a vida na caverna. Os progressistas pretendem decorá-la, adorná-la, reivindicam mais conforto e liberdade para nela viver.
(Extrato do trabalho de estágio, Escola Seundária Infanta D. Maria, Coimbra, 1980)