![]()
Ainda que a minha matemática não tenha ido além do quinto ano do Liceu ( no meu caso do seminário) e ainda que nunca tenha sido bom aluno na matéria, tive a felicidade de no quinto ano ter reprovado a matemática. Ficava obrigado a ir prestar nova prova no regresso das Férias Grandes, em Outubro. Pela primeira vez me via confrontado, só, sem qualquer apoio, a entender toda a matéria. Daí resultou, com estudo aturado - com o grosso livro contendo a matéria do terceiro, quarto e quinto ano de autor de apelido Calado e com o caderno de exercícios de Palma Fernandes - o meu entendimento da matéria, descobrindo, com surpresa, que os exercícios matemáticos me davam prazer. A matemática, como nenhuma outra matéria, exige concentração, treino, persistência. Cada problema é um desafio e o espírito não sossega enquanto não encontra a solução.
Enquanto professor, de Filosofia, sempre me questionei sobre as altas taxas de insucesso na disciplina de matemática e fiz mesmo algumas investigações, a título pessoal, sobre o assunto. Aliás, a aprendizagem e os resultados da Filosofia, situam-se na confluência do Português - vertente discursiva/expressiva e da Matemática - vertente lógica.
Nesta obra o autor defende a tese de que em Portugal não existem matemáticos, com excepção de Pedro Nunes, tal se devendo a um problema de (falta/má) educação. A mesma tese, digo eu, é válida igualmente para o caso da Filosofia, cujos requisitos de aprendizagem são, em grande parte, idênticos. Num e noutro caso a incomodidade do raciocínio abstracto, a aversão ao teórico, o querer resultados à vista, algo de palpável. A matemática pura e a metafísica pertencem ao reino das coisas que não servem para nada e os portugueses não têm tempo para isso, não estão com meias medidas e querem ir diretamente ao assunto. Sentem o que Fernando Pessoa exprimiu poeticamente: "Pensar dói como andar à chuva".
Por outro lado, periférico, Portugal ficou sempre longe da produção científica e cultural.
Católicos, apostólicos, romanos, conservámos os rituais religiosos em língua latina, sem entender da religião, senão o folclore das festas, das imagens de santos, virgens, anjos querubins e serafins - a representação da corte celestial presidida pela Santíssima Trindade.
Católicos, ficou-nos vedado o acesso à palavra de Deus para quem a igreja de Roma considerou que apenas o latim era língua digna. Por isso, se considerava inútil e até contraproducente o aprender a ler e a escrever.
Católicos puros, duros e analfabetos, invejosos dos judeus cultos e ricos, subservientes aos interesses de Castela, decretou-se que os judeus que não se convertessem, fossem expulsos. Para o que se crIou Tribunal do Santo Ofício.
Católicos transportámos para as relações sociais os rogos e os pedidos aos santos para favorecimentos pessoais, apadrinhamentos, tráfico de influências, enfim, um arquétipo de corrupção.
Toda a nossa história é uma história de má educação. Todo o trabalho que exigir continuidade, persitência, sustentabilidade, massa crítica estão votados ao fracasso. Por isso, a nossa má educação. Por isso,não há na nossa história nem matemáticos, nem cientistas, nem filósofos. Temos artistas, nomeadamente, poetas cujas exigências intelectuais são outras.
O facto aceite de que os portugueses são muito bons na arte do desenrascnaço corrobora o que se disse: porque não se previu, tem que se remediar. Peritos em estratagemas e artimanhas inventadas, aprendidas e praticadas desde o início da escolaridade. O astrolábio lusitano é a melhor ilustração do espírito prático e do desenrascanço dos portugueses.
A cultura é para a educação e o conhecimento o que o clima é para o desenvolvimento das plantas.
O que nos falta é luz e calor.