Abraço - José Luís Peixoto - Uma longa leitura
julmar, 27.07.12
Livro de cabeceira desde o início do ano, é mesmo para ler devagar.
Autobiográfico? Sim, e depois? Que saberemos dele que não seja saber de nós mesmos? Depois de escrevermos sobre o que se passou connosco e as nossas circunstâncias, aquilo de que falámos já não é o que era. Falar, escrever é ficcionar. E tudo isso é literatura como o autor nos mostra ao longo das folhas da sua vida tornadas em folhas de livro e de que é exemplo o texto Scrable.
O que me encanta no autor é a forma fácil(?) como o fluir quotidiano banal se transfigura em forma literária, como surpreende o tempo, o espaço, o gesto e como se avizinha inesperadamente da interrogação metafísica sem cair na tentação de por aí continuar.
Experimentemos, com o texto "Dentro dos meus olhos"
A minha mãe aparecia e desaparecia. A casa era um labirinto de sombras. O quintal suportava o tempo nos ramos dos pessegueiros. As ruas da vila aproveitavam o descanso. Era um serão do início de Setembro, um silêncio morno, a ideia de um lago.
Isto é literatura. Perante a beleza e o imaginário da forma, a história - era véspera de fazer doze anos - torna-se secundária. Assim, a arte torna-se mais importante que a vida.
Os que têm medo de se expor não saem da realidade. E a realidade é uma casa muito sombria de que fazem prova diária as revistas cor de rosa e os realities que alimenta a cultura preguiçosa dos espíritos pimba.